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15/03/2000
O HOMEM QUE QUER SER CIBORGUE
Renata Aquino

Ele implantou um chip no braço para pesquisar como o sistema nervoso humano responde às emoções como dor, prazer e felicidade.

Kevin Warwick se considera mais um engenheiro do que um cientista. Professor chefe do departamento de Cibernética da Universidade de Reading, Inglaterra, ele deixou a escola aos 16 anos. Foi trabalhar na British Telecommunications, onde ficou até os 22. Fez faculdade em Aston e PhD na Universidade de Londres. Há 12 anos estuda a interação homem-máquina. Suas pesquisas sempre envolveram a robótica a interação homem-máquina. Em 1998, Warwick implantou um chip no braço que permitia que seu corpo pudesse ser identificado por computadores que abriam as portas de um aposento para ele ou o cumprimentavam quando se aproximava. O próximo implante do cientista irá gravar todas as descargas elétricas decorrentes de suas emoções, movimentos e sensações. O propósito? Fazer com que estes mesmos sinais sejam enviados de volta, diretamente ao cérebro do pesquisador. Assim seria possível reproduzir sensações de medo, amor, ódio etc. independente do estado emocional de Warwick. Além disso, teoricamente seria possível fazer com que seu corpo executasse movimentos remotamente. Em entrevista à Magnet, Kevin Warwick afirmou que se o homem quiser sobreviver, terá que se adaptar às máquinas e essa adaptação passa necessariamente pelos implantes. De acordo com o professor, quem não quiser virar ciborgue irá virar "chimpanzé". Confira a entrevista e entenda porque um dia seremos todos meio-homens, meio-máquinas.

Magnet: No livro "March of the Machines", o assunto principal é uma Era das Máquinas.  Você pode falar um pouco sobre isso?

Kevin Warwick: Trata-se da dominação dos humanos pelas máquinas. O que nos faz dominantes atualmente? A nossa inteligência. No futuro as máquinas terão muito mais capacidade de processamento do que hoje. Não poderemos dominar as máquinas: Elas nos controlarão, porque serão mais inteligentes do que nós.

M: Dentro dessa perspectiva, como você vê o futuro?

Warwick: Estamos em uma época em que o poder vem do conhecimento tecnológico. Assim, os países tecnológicos ditarão o futuro. Teremos armas que não necessitam de homens para a operá-las. Estamos indo para um cenário de guerra tecnológica sem humanos envolvidos. Daqui a 30 anos, as máquinas decidirão o que deve ser ligado ou desligado no mundo. Uma máquina inteligente não deixará que alguém a desligue; assim, passará a ter poder decisório. Não estamos longe disso. No momento, existem algumas 'máquinas' assim. Por exemplo, a Internet. Não há formas de acabar ou 'desligar' a Internet. E existirão muitas outras.

M: Sua pesquisa em Cibernética tem qual objetivo então?

Warwick: Se os humanos optarem pela não integração às máquinas, serão dominados por elas. O caminho é nos ligarmos mais às máquinas, daí o conceito de Cibernética. O organismo cibernético é parte humano, parte máquina. Há quem não goste da tecnologia (e isto é uma opção). Essas pessoas serão como chimpanzés, serão subespécies. As máquinas podem tornar os homens mais inteligentes. Os ciborgues serão mais inteligentes. Eu estarei muito feliz por ser um ciborgue.

M: Você disse a pouco tempo que nasceu humano por acidente. O que significa isso?

Warwick: Somos muito limitados. Nossos cérebros são muito pequenos para o que será possível no futuro. O mundo é muito mais complexo. Seria fantástico se tivéssemos muitos mais sentidos, como a percepção raio-x, ultravioleta, infravermelha etc. Nosso cérebro é simples, mas temos o nosso corpo. Por isso penso -no futuro- em adicionar mais poder ao corpo humano.

M: Mas o senhor acha que somos autorizados a ter todo esse poder e conhecimento?

Warwick: Toda tecnologia que vem para mudar o mundo tem pontos bons e ruins. Ciborgues são uma redefinição do ser humano. O que pode ser bom para um ciborgue pode não ser para um homem. Quanto à possibilidade de perceber o infravermelho, seria ótimo se pudéssemos ter essa característica. Quanto aos governos perceberem ou não o quanto isso é bom seria outra questão. Os políticos estão muito atrasados em relação ao que é bom ou ruim para a Ciência , tanto mais em ética e moral... Realmente, temos que confiar na própria Ciência.

M: A Ciência pode ajustar a moral?

Warwick: A moral irá se ajustar a uma moral-ciborgue, diferente da humana. Isso é algo que percebi com meu primeiro implante. Senti estar muito próximo do computador, que era quem abria as portas e acendia as luzes. Quando humanos e computadores estiverem mais familiarizados, toda a moral será diferente. Haverá a possibilidade de punir alguém desligando uma máquina que tenha importância vital para ele. Isto afetará toda uma gama de valores que nós conhecemos hoje.

M: O senhor trabalha com robôs. Certa vez um deles foi proibido de viajar ao lado de seu assento no avião.

Sid Sussurante (Hissing Sid)

Warwick: Sim, fazemos robôs para o Museu de Ciências de Londres. Eles poderão entrar em perseguições um ao outro, como em um cenário de "Predador", e poderão ser operados por controle remoto ou serem independentes. Ano passado, fui com minha equipe para Moscou. Levamos um gato autômato chamado "Sid Sussurante" (Hissing Sid). A British Airways não quis aceitá-lo porque era proibido portar animais. Dissemos que era um robô, mas não acreditaram. Chamamos os jornais, mas ele acabou indo em uma outra companhia.

M: Sobre o implante que você colocou no braço. O senhor recebeu críticas?

Warwick: No outono de 98, tínhamos toda a tecnologia necessária aqui para fazer o implante. Simulamos tudo em um computador, mas apenas fazendo realmente a experiência é que poderíamos saber os resultados. As pessoas que me criticaram por colocar o implante estavam sendo mesquinhas e ignorando maiores possibilidades. Quanto às críticas, tanto na nossa vida como na ciência, as pessoas não gostam de pensar fora dos padrões. Seria seguro pensar sempre dentro do que conhecemos? Ouvi Stephen Hawking (um dos maiores astrofísicos do mundo) dizer que o mundo é governado por regras. Eu discordo totalmente. O mundo é o que é e nós tentamos compreendê-lo. Conforme o tempo passa, vamos compreendendo tudo diferentemente. Gosto de pensar de fora da "caixa", para além dos padrões do que é possível ou não. Não gosto de seguir regras. Devemos desafiá-las, encontrar as leis por nós mesmos. Acho até que podemos viajar mais rápido que a velocidade da luz, por exemplo.

M: Vamos falar um pouco mais sobre a questão técnica do implante. Ele está conectado às suas fibras nervosas?

Warwick: Sim, consigo gravar sinais motores e sensoriais que trafegam pelo corpo, além de outros. Tive apenas um implante, que ficou no meu braço por 9 dias. O segundo será feito daqui a 16 meses. O primeiro teve 2 cm x 4 mm, o segundo será na forma de um quadrado de 2,5 cm x 2,5 cm.

M: Você tem medo de algo sair errado?

Warwick: Não sou muito corajoso com operações, acho que é um medo comum. Temo que algo não funcione, o que já é mais um temor científico. Outro medo é o de reproduzir as sensações e o meu cérebro não saber como lidar com isso. Ele pode reagir, posso enlouquecer, o que acontecerá? São medos mais longínquos do que o da operação mesmo. Mas meu temor é irrelevante frente às possibilidades que se abrirão se tudo der certo.

M: Há a possibilidade do governo controlar as sensações humanas e termos um mundo como o das obras do escritor George Orwell?

Warwick: Não devemos parar de pesquisar preocupados com o que pode acontecer. Se fosse assim, Graham Bell nunca teria inventado o telefone pois não saberia que efeitos sua criação teria nas pessoas.

M: Sua pesquisa pode levar a criação de um novo tipo de drogas, as chamadas drogas cibernéticas, do que se tratam?

Warwick: Gosto da idéia de gravar a sensação, de tomar uma taça de vinho e poder sentir a sensação depois. Hoje conseguimos alterar o lado químico do corpo humano por meio de drogas e outras substâncias, agora, se pudermos afetar o lado elétrico de nós mesmos, isso seria uma fantástica descoberta. Podemos, eletronicamente, fazer alguém ficar um pouco bêbado? Se pudermos, então teremos um novo horizonte a pesquisar.

M: O filme "Matrix" procura passar um conceito que é sonho de qualquer pessoa em idade escolar, o de aprendizado acelerado. Você acha que isso é possível?

Warwick: Ainda falta algum tempo para chegarmos lá, mas será possível inclusive "pregar peças" no cérebro. Podemos ter a memória de coisas que nunca fizemos. O computador pode ser uma fonte de memória extra. Com os robôs, percebe-se o quanto o aprendizado pode ser acelerado.

M: É possível recuperar cérebros que sofreram algum dano causado, por exemplo, por derrame?

Warwick: Não sou médico, mas acredito que sim. Uma experiência em Atlanta com um paciente que teve um derrame cerebral teve resultados fantásticos. É difícil pensar em limites, no entanto. Uma pessoa com Mal de Parkinson pode ser curada por meios eletrônicos, temos que pesquisar muito ainda. Não sei se poderemos chegar a extremos como uma cyberlobotomia, por exemplo.

M: Quais são os objetivos práticos mais imediatos do seu trabalho?

O primeiro implante do Dr. WarwickWarwick: Estamos mais direcionados para três áreas. A primeira é a do movimento. Por exemplo, paraplégicos talvez possam voltar a andar. Um computador pode controlar o andar de uma criança. Seria ótimo se um computador controlasse minha perna para que eu pudesse jogar futebol como Pelé... Eu seria quase um deus, como ele é. A segunda área é a da informação extra-sensorial. Um senso de distância para os objetos, essencial para pessoas cegas. Esta seria uma grande possibilidade. A terceira área é a de sensações emocionais: a possibilidade de registrar felicidade, tristeza ou pensamento. Podemos até estudar a telepatia. Minha esposa já concordou em se submeter à pesquisa comigo. Ela também terá um chip implantado interligado eletronicamente com o meu. Iremos trocar pensamentos.

M: Isso não poderia acabar com seu casamento?

Warwick: Há esta possibilidade (risos). Quando a minha esposa ver um homem mais novo passar e ficar excitada, eu vou sentir e irei pensar "o que será que ela está imaginando?". Não sei se você vai poder dar este exemplo na revista, mas... quando você está fazendo sexo com seu parceiro e pergunta "está bom?" e a pessoa diz "sim", a Cibernética te dará a verdade. Talvez isto não seja bom, mas são possibilidades que se abrem, e teremos que lidar com todas elas. MAGNET

Colaborou Alberto Alerigi Jr

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